Daniel Miglorancia pensa como engenheiro – e foi exatamente isso que fez dele não só um companheiro de vida para Adriana Auriemo, fundadora da rede de franquias Nutty Bavarian no Brasil, mas também o melhor sócio que ela poderia esperar para o seu negócio. A administradora tinha pouco mais de 20 anos quando resolveu deixar o estágio na empresa do pai (o empresário Caio Auriemo, fundador da rede de laboratórios Diagnósticos da América, a Dasa), para empreender sozinha. “Meu pai me pediu pra fazer um curso e entender melhor sobre franquias. Ele resolveu não seguir esse caminho, mas eu me apaixonei pela ideia e resolvi criar a minha rede.”
A história começou quando uma tia de Adriana, que havia conhecido as castanhas glaceadas nos Estados Unidos e voltado pra cá com um lote de matéria-prima e com o equipamento a bordo do avião, desistiu de vender os doces. “Então eu comprei o equipamento dela e fui para a Flórida negociar a exclusividade com o dono da marca”, diz a empresária. Na época, a Nutty Bavarian não tinha franqueados, era apenas uma fornecedora de equipamentos e da receita. Adriana conseguiu a exclusividade do produto no Brasil, desde que se comprometesse a abrir cinco pontos de venda em cinco anos. No primeiro ano, a marca havia aberto mais de 20 quiosques próprios. Foi aí que o senso de organização de Daniel entrou na história. Namorados à época, ele começou a frequentar o escritório da empresa e dar pitacos. “Não lembro de ter sido chamado, mas vi que um pouco de organização ali não seria ruim [risos]”, diz. Esse jeito prático complementou o estilo criativo e ousado de Adriana trabalhar. Graças a essa união, hoje a empresa tem 139 pontos de franquia, 90 funcionários e prepara uma expansão internacional – abriu o primeiro quiosque na Flórida, onde deve ter os primeiros franqueados em breve. Além dos quiosques espalhados por shoppings, cinemas e aeroportos, fornece o produto a grandes eventos e vende os cones com castanhas no varejo, além de fornecer os grãos como ingredientes para marcas da indústria alimentícia, como os sorvetes Bacio di Latte. E, faz pouco tempo, começou a entregar via iFood. Aqui, os dois contam os detalhes dessa trajetória de 23 anos juntos, 21 deles dividindo o escritório.
Vocês parecem ter jeitos de ser opostos. Como isso aparece no casamento e na empresa?
Daniel: Adriana é cheia de ideias, expansiva, criativa, muito empreendedora. O pai dela é um empreendedor nato, o meu era um executivo de uma grande empresa. Eu fui criado com essa ideia e possivelmente seria um engenheiro de carreira. Mas descobri que tinha um lugar na empresa logo no começo, vi que poderia organizar tudo para que ela conseguisse fazer suas ideias acontecerem. Com ela, aprendi que não tem uma fórmula certa pra fazer as coisas, aprendi que dá pra encarar a vida de um jeito mais leve, ela tem uma delicadeza com as pessoas que eu não tenho…
Adriana: Uma vez fizemos um curso em que o professor deu um teste de perfil. Os nossos são absolutamente diferentes em todos os pontos. Recentemente, refizemos esse teste e foi libertador. Eu parei de me cobrar para fazer bem algumas coisas que não têm a ver com minha personalidade, mas que ele faz muito bem. E também percebi que não adianta esperar que ele faça as coisas do meu modo. Gosto de falar com pessoas, de relacionamento, de abrir portas, fazer negócios, ir a eventos. Quando ele ia comigo, não era o melhor pra ele. Agora ele pode por foco no que faz melhor, organizar, criar métodos, abrir frentes em áreas onde ele atua, como os eventos de triathlon, que ele ama. Cada um cuida da sua parte e assim a gente tem mais assunto quando chega em casa.
Que história é essa dele ter pedido sua mão em casamento com uma planilha?
Adriana: Ele chegou até mim com umas planilhas e disse: “acho que dá pra gente casar, vamos casar?”. Aí ele resolveu que iria contar para o meu pai. Chamou ele de lado, começou a mostrar os números da Nutty, provou que estava dando lucro e, em seguida, pediu a minha mão em casamento. Meu pai não respondeu na hora, foi dizer “sim” uns meses depois. Não foi nada romântico…
Qual a maior vantagem de ser sócio na vida e na empresa?
Adriana: O companheirismo e a compreensão fazem toda a diferença pra mim. Se eu tivesse um sócio qualquer, talvez ele não compreendesse minha necessidade de me dedicar aos filhos quando eram pequenos. Nós tivemos três filhos com dois anos de diferença um do outro. Tinha um bercinho no escritório quando veio o primeiro, o Bruno. Eu pude estar com eles quando precisavam e, quando eu não podia, o Daniel estava. Até hoje essa parte funciona muito bem, a gente se entende.
Daniel: Tem a confiança também. Cada um sabe que o outro quer o melhor pra empresa, não interessa o que esteja fazendo. A intenção é a melhor. Eu já tive uma outra sociedade que não deu certo, com um cara que eu achava que era meu amigo, então sei que essa sociedade aqui é uma benção… São duas pessoas empurrando a coisa pra mesma direção. A empresa já ajudou no casamento e o casamento já ajudou na empresa. Tem também coisas que eu nunca imaginei que iriam acontecer. Recentemente fui à ONU falar do nosso projeto de impacto social! Eu fiz um curso em Harvard e levei a Nutty Bavarian como case. Me sugeriram a possibilidade de dar o quiosque para pessoas que não têm capacidade de pagar pela franquia, mas que podem ser financiadas para se tornarem empreendedores. O primeiro desse formato já está funcionando, é um casal de refugiados sírios. Eles pagam o investimento com o resultado do negócio. Levei até para o meu hobby, que é o IronMan [maior competição de triathlon mundial]. Quando fui à nutricionista para me preparar, ela disse que, em provas longas assim, não daria pra ficar só no gelzinho e do isotônico. Então me perguntou se eu gostava de castanhas [risos] pois são perfeitas pra essas provas. Agora estamos patrocinando uma equipe do Ironman. Percebemos um outro caminho potencial para o produto…
“A gente cuida um do outro. Não é em toda sociedade que você tem isso”
Quais os momentos mais difíceis que vocês viveram juntos como empreendedores?
Adriana: Logo no começo da empresa a gente importou um container de amêndoas. Botamos no galpão e, quando a gente abriu a porta, estava lotado de bichos. Era muita coisa, algo como nosso estoque para um ou dois anos. A outra é que, nossas vendas durante um bom tempo estavam concentradas nos aeroportos. Aí houve uma licitação e tivemos que tirar todos os quiosques de uma vez. Era coisa de 80% do nosso faturamento no começo da empresa. Pensei que iríamos quebrar, mas nesses momentos a gente se apoiou para ter a calma e encontrar novos caminhos. Investi mais em relacionamento, passei a participar de todos os eventos para que a marca ficasse mais conhecida… Aprendi muito com tudo isso.
Daniel, quando você falou em confiança, veio uma emoção nos seus olhos. O que mais esse encontro trouxe para a vida?
Daniel: Eu nem sei como seria a minha vida sem a Adriana. Tenho uma mulher que gosta de mim, meus filhos são super legais, a gente não teve vários problemas que os amigos têm com os filhos. Ela é muito tranquila com a vida. Claro que a gente teve dificuldades, mas a Adriana tem um jeito que eu aprendi de ver a vida e acho que, por conta disso também, tudo fluiu tão bem que eu me lembro muito mais das coisas boas do que das ruins. Recentemente fui para o ONU falar nosso projeto de impacto social, em que convidamos pessoas com poucos recursos, mas muita capacidade, para serem franqueados. O nosso primeiro é o quiosque de uma família síria que já está há um ano conosco. Também faço parte da Entrepeneurs Organization, que reúne 13 mil empreendedores no mundo e que tem a ver com o meu jeito de fazer networking. Enfim, encontrei meu lugar e estou muito bem graças ao fato de estarmos juntos, trabalhando junto, criando uma família incrível juntos.
Adriana: Voltando no tempo, houve muitos momentos difíceis. Mas até pelo carinho mútuo, quando ele via que eu estava mais preocupada, ele me acalmava. E eu sei que esse esforço nem é pela empresa, é pelo cuidado comigo. Do mesmo jeito, eu sei que tem horas em que eu não devo trazer aquele assunto porque vai trazer um stress desnecessário, então espero a hora certa. Acho que a gente cuida um do outro. Não é em toda sociedade que você tem isso.
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